Encontros improváveis



Marcus Vinicius Batista

Minha esposa Beth me chama de candidato a vereador. Minha filha Mariana reclama como conheço tanta gente. Shopping, supermercado, feira livre, praia, show de rock, estádio de futebol, teatro, sempre encontro alguém para dar “oi, tudo bem, beleza?”

Não significa ser popzinho, como diz minha filha ou minha sobrinha Rafaela. Encontrar pessoas é fruto de 14 anos como professor universitário, com média de 300 alunos ao ano. Quase 25 anos como jornalista, passando por diversas empresas, de todos os tamanhos. Uma vida inteira de peladas de final de semana, às quintas, às segundas e assim por diante. É normal encontrar as pessoas em lugares movimentados. E acredito, modéstia à parte, que a resposta decorre de tratar as pessoas com educação e respeito.

Passei na vida por dois encontros improváveis. O primeiro, menos surpreendente, foi dar de cara com um colega de redação numa praia em Fortaleza, no Ceará. Sequer sabia que o sujeito estava de férias.

O mais curioso, porém, foi me sentar atrás da cadeira de um dos meus patrões, num teatro da Broadway, em Nova Iorque. Preferi ficar em silêncio. Vai que ele resolve me arrumar trabalho nos Estados Unidos.

Nesta última semana do ano, cruzei com duas pessoas, que proporcionaram experiências diferentes. Na segunda-feira, às dez da noite, seguia com meus filhos para a farmácia quando encontrei com José Gabriel, na esquina da avenida Pedro Lessa com o canal 5.

Não o via há dez anos. Ele foi meu aluno, orientei o TCC dele, testemunhei com orgulho o estudante superar de longe o professor. Ele fez pós-graduação em Portugal, onde se tornou mestre e doutor. Hoje, é professor por lá. Um acadêmico em nível de excelência, usando chinelos de dedo, camiseta e bermuda a uma quadra da minha casa.

Ao lado da mãe dele, conversamos por mais de meia hora. Descobri que a mãe mora a três quadras do meu prédio. Colocamos a conversa em dia sobre universidade e Jornalismo. Espero revê-lo.

Na noite seguinte, fui ao shopping com meus filhos para que tomassem um sorvete. Entrei na livraria para ver se haviam promoções. Quando saíamos de lá, encontrei Elton com suas duas filhas, Sophia e Sara.

Elton foi meu professor no primeiro ano de Psicologia. A proximidade de idade e de visão de mundo nos tornou amigos. Já éramos colegas de universidade, o que ficou mais fácil, mas a vida acelerada sempre adiou aquela cerveja, lembrada quase sempre às 22h30, após um dia inteiro de aulas.

Começamos a bater papo. Eles iriam ao Carrefour comprar umas tranqueiras para jantar em casa. Nós, à casa do meu pai pegar uma bicicleta. Seguimos juntos. Paramos na entrada do supermercado e continuamos a conversa, que envolvia Natal solitário, viagens de réveillon, passagens aéreas mais baratas, visto para os Estados Unidos.

Quando olhamos para o lado, Mari, de 14 anos, falava com Sophia, de 13, como se estudassem juntas desde o berçário. Sara, de 8, dialogava com Vini, de 7, sobre games, youtubers e desenhos animados. Virei para Elton e disse: “precisamos dar de comer pra essa meninada.”

A ideia foi aceita por unanimidade. Sara sugeriu comida japonesa. Aos 8 anos, ela nos levaria à falência numa noite. Sugeri o paraíso das crianças: porção de batata frita no bar Diferente, campeão neste quesito gastronômico.

Foram mais duas horas e meia de um encontro improvável. Duas porções de batatas fritas, quatro litros de Coca-Cola, cerveja, pedaços de pizza, daquelas maravilhosas a la padaria, o cardápio perfeito para férias, crianças, calor e relógios quebrados.

Mari e Sophia tagarelavam e mexiam em seus celulares. Sara e Vini terminaram a noite no bar, correndo em volta da mesa, assoprando pelos canudos que um dia serviram para refrigerante.

Eu e Elton administramos a bagunça, enquanto dialogávamos sobre trabalho, família, Santa Catarina (terra dele!), viagens minhas e até futebol.

Quando o gás acabou, caminhamos juntos por mais sete quadras até que as rotas para casa nos separassem. As redes sociais farão o trabalho para o qual nasceram: nos aproximar ainda mais. Os seis!

Mais do que fechar para balanço, o final de ano é o melhor momento para encontrar pessoas que não costumam esbarrar em você na rua. Temos tempo para recomeçar nossa história com elas, dividir e improvisar um encontro, que brotou sem expectativas, sem fantasias, sem avaliações prévias.

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