No ônibus, me sentei entre a felicidade e o mau humor



Giovana Soares e Marcus Vinicius Batista

Ao entrar no ônibus, me sentei ao lado de um casal de idosos. Era o trajeto para o trabalho e, normalmente, uso fones de ouvido. A música me distrai e deixa o trânsito menos aborrecido.

O senhor era o exemplo da educação e do bom humor. Falou bom dia e fez piada com outro rapaz. Parecia todo feliz. O comportamento dele ficava mais escandaloso porque a contradição estava sentada ao lado. Não eu, mas a esposa dele.

Ela era cara fechada, a extinção das risadas, nenhum assunto, ninguém a tirava de seu direito de não ser amável. Porém, ela incomodava porque externava a amargura, a ranhetice.

A mulher reclamava o caminho todo, de tudo e nada ao mesmo tempo. Ela era tão ranzinza que as queixas ficaram sem sentido, sabe? Juro, a senhora incomodava de tanto que murmurava.

As reclamações chegaram ao ponto de um rapaz que estava sentado no banco da frente levantar e trocar de lugar. Os fones de ouvido saíram das bolsas e mochilas e saltaram para os ouvidos de muitos passageiros. Alguns criaram coragem e olharam para o casal.

O idoso, proprietário exclusivo do bom humor, pedia para ela ficar quieta, celebrar o dia e parar de reclamar de tudo. Nada adiantou. Ela seguia firme, irredutível, e discutia com ele.

Quando o ônibus entrou na orla da praia de Santos, abriu um sol maravilhoso, o dia estava lindo. Mas ela reclamou do sol. O marido, que recusava a santificação pela paciência, não aguentou mais ela reclamando. Aí, o último dos moicanos da tolerância foi um pouco mais "grosso": mandou ela calar a boca. Ele não estava mais suportando estar do lado dela e só ouvia protestos.

De rude à irônico, ele perguntou para a esposa se queria que ele "apagasse o sol". Eu até ri nessa hora porque ele foi sarcástico, mesmo de saco cheio. E ela nada de parar de falar. Só piorava mais quando ele pedia para parar.

O marido se levantou, saiu do lado dela e falou que a esposa não estragaria o dia dele como já tinha feito com o próprio.
Se até o esposo, pessoa que te ama, que jurou amar na riqueza e na pobreza, na saúde e na doença, no dia de sol e no dia de nuvem negra na cabeça, não te aguenta, imagina quem é de fora?

Só tenho que agradecer ao meu fone de ouvido, que me poupou do contágio do mau humor daquela senhora. Reclamando ou não, o sol permaneceu intacto e eu cheguei ao trabalho, como todos os dias. Problemas todo mundo tem e me esforço para que eles não me deixem chata.

Sou grata. Recebi a dádiva de acordar hoje. Bom dia!

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