Meu amigo traficante



Paulo Montenegro

Em julho de 2014, participei de um treinamento. Em um determinado momento, recebi uma carta de quem me deu o curso e, até aquele momento, ele não era meu amigo. Após uma série de palavras, e outra série de lágrimas, descobri que alguém que eu mal tinha contato se importava comigo, admirava e queria me ver feliz.

Acabei de reler essa carta, e ainda me impressiono como existem pessoas que gostam de nós, mas são invisíveis. Infelizmente, não consegui encontrá-lo para agradecer pessoalmente pela carta; então, meu abraço foi por inbox, visualizado e respondido. Descobri que meu camarada havia saído da faculdade, uma pena, tinha futuro na área.

Senhor K (acho que esse nome combina bem com sua personalidade) é bem diferente das pessoas que normalmente estão em meu círculo social.
Extremamente educado, daqueles que, quando bate o dedão em uma quina qualquer, solta um sonoro “DROGA”, chega a ser fofo.

Ele não fuma, não bebe, pratica esportes, é jovem, e homossexual assumido. Casado. Mora no morro, em uma casa maravilhosa, tem um belo carro, Iphone, já visitou o exterior diversas vezes, uma realidade bem diferente da minha.

Poucas semanas após a notícia de que ele havia desistido da faculdade, chegou uma notícia mais surpreendente: Senhor K estava vendendo drogas.
Logo a notícia se espalhou, disseram que esse era o motivo de sua saída do curso superior, e que ele estava se dando bem em seu novo “negócio”.

Imediatamente, aquele cara doce e carismático virou motivo de chacota, indignação e até revolta de pessoas que antes o idolatravam. Questionei sobre quais “produtos” ele estava comercializando devido a meu preconceito inicial. Imaginei ser maconha; afinal, é uma das drogas que mais circulam entre os jovens, muito fácil de vender e com rentabilidade interessante.

Para minha surpresa, era algo pior, meu querido amigo estava vendendo doce. Uma droga altamente viciante, cara, e que já levou milhares de vidas, por ser altamente viciante e prazerosa para o usuário. Como sou um cético incurável, não comprei de cara o que todos estavam dizendo, então fui descobrir até onde seguia a tal verdade. Não precisei ir muito longe.

Como um tapa, apareceu um post dele dentro de um desses duvidáveis grupos de Venda/Troca do Facebook, onde meia volta aparecem armas, celulares roubados e, sim, drogas. Não tinha como negar, a verdade estava registrada e disponível para quem quisesse ver.

Eu sou contra o crime, acredito que todos aqueles que tiram proveito da inocência de outros, que causam o mal, devem ser processados, julgados e punidos. Mas nesse caso, não havia muito o que eu poderia fazer, eles eram meus amigos também.

Até o presente momento, não existe lei que condene um grupo de fofoqueiros à cadeia, ou a serviços comunitários, que seja.

O Senhor K passa bem e o negócio de docinhos para festas, também.

Obs.: 19º texto a partir do curso "Como escrever crônicas."

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