A novidade nas academias chiques é um
pó misturado na água. A poção mágica é chamada de Jack 3D, em função das
substâncias químicas que compõem o produto. O milagre do momento aumenta a
capacidade de treinamento e reduz a fadiga do atleta.
O Jack 3D engrossaria as prateleiras
dos suplementos se não fossem dois problemas. A substância é proibida no
Brasil, por ser considerada doping. E provoca efeitos colaterais como
taquicardia e problemas neurológicos.
O que leva pessoas normais a buscar
compostos ilegais para treinar em academias? Se a medida é injustificável para
atletas de ponta, imagine para os freqüentadores comuns. Por que arriscar a
própria saúde com ações que seriam decorrentes da própria busca por vida
saudável?
A ditadura da estética se esconde
atrás de nomes pomposos, métodos revolucionários e tratamentos divinos. A
aparência passou a ser a medida de muitas circunstâncias. Estar no corpo padrão
significa a legitimação de um modo de viver, dependente do olhar de outros
escravos da forma, indiferentes ao conteúdo.
Moldar a casca se transformou em
obsessão. O Brasil, hoje, é o segundo país do mundo em número de cirurgias
plásticas e de freqüentadores de academias e no consumo de remédios para
emagrecer.
No filme Meia-noite em Paris, última
obra de Woody Allen, há uma cena em que o protagonista, um roteirista vivido
por Owen Wilson, evita que a esposa do escritor Scott Fitzgerald cometa
suicídio. O roteirista foi transportado no tempo e se encontra na capital
francesa, nos anos 20.
Depois de agradecer a ele pelo
salvamento, a esposa de Fitzgerald ganha um comprimido do roteirista, que diz
algo como:
— Será sua salvação no futuro!
O comprimido era um Valium. A piada
de Allen é, obviamente, atual. As relações sociais viraram patologias. Qualquer
comportamento fora do padrão é passível de diagnóstico. Claro que a
popularização de certos termos pode significar mais informações sobre doenças,
mas o que se vê – em muitas situações – é a popularização do milagre em forma
de remédio.
Se o sujeito trabalha demais, está
sob stress. Dá-lhe relaxantes e outras pílulas. Se alguém segue melancólico,
deve estar deprimido. Uma cartela de Prozac ou outras tranqueiras coloridas
para reanimar o tristonho. Se a criança é bagunceira, provavelmente será hiperativa.
A solução: ritalina nela!
Estamos doentes de corpo e alma. Como
escravos do corpo perfeito, também fracassamos diante da ideia de que a
felicidade não acontece o tempo todo. Não compreendemos angústias, ansiedades e
derrotas momentâneas, inerentes às relações com outras pessoas.
A impaciência e a incapacidade de
olhar para si com o devido tempo de reflexão nos fazem parecer com aqueles
sujeitos ingênuos que eram enganados por caixeiros viajantes e seus remédios
tão exóticos quanto fruto de charlatanismo, no século 19. Tudo para alcançar a
falsa normalidade, ditada e aprovada pelo outro, também algemado pela estética
feliz a qualquer preço.
Cada vez que passo em frente a uma
farmácia-shopping, me lembro da história contada por uma psicóloga. Quando encontrar
crianças reunidas, espere por moleques e meninas agitados. A criança quietinha,
sentada no cantinho, xodó de adultos pelo comportamento exemplar, é
provavelmente a deslocada. E não está, necessariamente, doente.
As demais crianças? Apenas crianças.
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